o espírito escreve
sem que o gesto da grafia seja devido
Luíza Dunas (Luísa Sousa Martins) nasceu em Lisboa, que tem por sua terra oráculo, porto e pórtico das suas vi(r)agens. Os escriptos surgem-lhe por obediência, assinalando imperativo que lhe inspira o cumprir de uma travessia revelatória de profundos, da qual se sente tão-só a decifradora e a primeira leitora.
nos quatro braços a velada rendição sob o véu negro, paixão a coberto branca nudez púrpuras preces.
domingo, 28 de abril de 2013
tua taça mãe! suma fonte última ceia, meu círio chão de lajes guardadora vestes de lua o escuro fundas-me luz das trevas toda a terra me jaz neste amor em que desabas todo o súbito choro é meu santo clamor, cai a noite, sobre mim a aurora - blimunda por dentro.
sexta-feira, 26 de abril de 2013
sacra prima vez no beijo sempre-noivos a iniciação pleno bosque, unas geografias, seiva indistinta, a ininterrupta e inefável única vez - casal primordial
terça-feira, 23 de abril de 2013
amor, súbito incessante urgente e eminente desprendimento.
segunda-feira, 22 de abril de 2013
noite na estrada cavalos correm, rostos vermelhos, troncos nus no deserto o poço húmidos chãos, feridas mãos no canto dos pássaros nocturnos o som uterino, ao grito avistam-se as brumas, salta a gazela.
adentro-me no jardim, minha casa, minha casta descalço-me junto ao cipreste percorro todos os arbustos beijo todas as flores cheiro todos os odores salto para este muro, sento-me junto à roseira toco-lhe o cacho de rosas e recordo a minha oração são rosas a minha oração, são rosas.
sexta-feira, 19 de abril de 2013
que sede, sede imortal, sede de morrer, sede deste mar, sede do areal, que sede de me impregnar, dessedentar vasta, vasta, vasta !
Do átrio e pelo ádito prossegue o jardim, passos sob o éden no transepto a dor, dourada, adorada flor perfume da espiga, pão em altar sangue em corpo, insigne, sacro.
quarta-feira, 17 de abril de 2013
não te confines à liberdade.
segunda-feira, 15 de abril de 2013
a semente do céu
à terra cai no primo ventre a raíz no húmus se entronca o gesto para o alto, os frutos do céu- religação
sexta-feira, 12 de abril de 2013
o sol arde, queima e abre a vera noite.
no terreiro a baga do cipreste, brasão lunar
o eco das orações nas pedras do templo
ajoelho-me de anoitecer.
num ponto indeterminável se determina o ponto de encontro.
segunda-feira, 1 de abril de 2013
nas longas noites de recobro teus passos inaudíveis a descoberto, pia mater, teu corpo e sangue lágrimas do amanhecer aberta a rosa no peito pousas a coroa, guardiã da vinha.