o espírito escreve
sem que o gesto da grafia seja devido
Luíza Dunas (Luísa Sousa Martins) nasceu em Lisboa, que tem por sua terra oráculo, porto e pórtico das suas vi(r)agens. Os escriptos surgem-lhe por obediência, assinalando imperativo que lhe inspira o cumprir de uma travessia revelatória de profundos, da qual se sente tão-só a decifradora e a primeira leitora.
Sísifo a cavalo aos ventos da noite, os seus olhos luzem ao céu, tez da
terra da montanha sacrificada, no dedo o anel da aliança caída, ah, o areal, pés agora na enseada azul, todo o corpo, o sal nos ombros, fé !
terça-feira, 7 de fevereiro de 2017
evaporamos pela abóbada do tempo
abrem-se-nos céus
sob a fina geometria dos éteres destilamos
soros solares de luas no beijo
e a sonoridade cristalina das sombras.
Há uma presença na agonia desta
manhã a reencarnar-se-me leveza que me obriga a enxergar na mais escura
paisagem, lembra-me uma fome, ou um deus, retarda-me as cinzas e o levantar-me
incrédula da cama para a novidade insuportável do dia, é que a luz tem
claramente um lado negro. Parece estar destinada a tomar todo o seu tempo,
para, como uma espada, me trespassar e desiludir-me o inferno. E eu rezo para
que aponte ao plexo solar toda essa brutal pacificação.
segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017
Quando o deito, o corpo é uma memória, um baú esculpido a cheiros e
jóias entes e sangues; quando é o corpo que me deita, sou o lençol
branco sobre o baú sacudido ao sol, passa-me o tempo, como se este
tivesse sido um sintoma de abstinência de respirar ou estátua
pulverizada.